Por vezes, as câmaras municipais parecem palcos de novelas onde o roteiro nunca muda — heróis previsíveis, vilões que juram ser mocinhos e bastidores que se disfarçam de bastiões da legalidade. A sessão da última segunda-feira (26), em Ribeirão Branco, foi uma dessas cenas que mereciam trilha sonora de série dramática e olhar cínico de narrador onisciente. Mas sigamos.
O Projeto de Lei Complementar nº 004/2025, aprovado em regime de urgência, mexeu na estrutura de gratificações de funções do Executivo. Nada de escândalo na forma, mas ruídos na condução. Ronaldinho Fiscal do Povo (PT) foi ao microfone com a frustração típica de quem foi excluído da festa: “uma hora antes, o prefeito se reúne com vocês e decide tudo”. Virgínia (Podemos), em eco, lamentou: “A gente também foi eleito, mas parece que não faz parte.”
Há uma liturgia silenciosa que se repete: projetos de impacto que chegam de última hora, discussões encurtadas e uma base governista que, mesmo discordando, vota a favor. Uma espécie de “amizade funcional” entre Executivo e Legislativo. Fala-se muito em união pelo bem do município. Mas que bem é esse que não aceita contraponto?
Em meio à pauta, o já conhecido silêncio sobre o caso do vazamento de prontuário médico de uma criança por parte do prefeito. O Ministério Público será acionado, de acordo com o vereador Ronaldinho Fiscal do Povo, mas a Câmara, por ora, assiste em modo paisagem. Nem uma linha de repúdio, nem uma comissão para apurar o que os olhos de todo mundo já viram.
No meio dessa cena, o vereador Flávio da Agricultura (PP) usou o microfone para reforçar que a gratificação é justa. Pode até ser. Mas a pergunta continua: justa para quem? Porque para os servidores da base, o “reajuste” parece demorar mais do que o trâmite relâmpago de projetos alinhados ao Executivo.
Entre agradecimentos pelas estradas raspadas, indicações de lombadas e moções de aplauso, a sensação de déjà vu toma conta. A política municipal às vezes lembra aquela série que amávamos e agora assistimos por inércia, esperando um episódio surpreendente. Quem sabe um dia.
Talvez o mais simbólico da noite tenha sido a honestidade nervosa da vereadora Nena da Neuzona (PP), que subiu à tribuna dizendo que estava ali porque seus eleitores reclamaram que ela “andava calada”. E quem cala, em política, consente. Ou desaparece.
Enquanto isso, projetos que tratam de nome de rua e calendário religioso passam com a fluidez de quem não incomoda. É mais fácil legislar sobre datas do que sobre dados — especialmente os que vazaram das mãos do prefeito sem explicação.
A próxima sessão está marcada. Novos temas virão. Mas a pergunta persiste: o que realmente se vota quando se evita o confronto? E mais: até quando a Câmara de Ribeirão Branco vai preferir o conforto das pautas mornas ao invés da coragem de enfrentar o que realmente importa?
Porque a cidade não precisa só de lombadas e moções. Precisa de transparência. De ética pública. De vozes que não tremam quando o assunto queima na mão.